terça-feira, 5 de outubro de 2010

Ficção de segunda

Vou buscá-la à TV. O big shot da oposição queria dar-lhe boleia, mas ela não quer cá confusões, a amiga vem buscá-la. Vem bonita, cansada, ainda a largar vapor por causa dos homens e mulheres que submetem todos os problemas de Portugal à questão de classe. Não é assim, não é assim, diz ela. E eu acredito. Ela sabe tanto que eu não sei.
Liga ao marido, fala com as filhas, desliga-se o telemóvel, deixamos o mac em casa e seguimos leves para a rua. Os taxistas gostam dela, diz as coisas que eles queriam dizer com as palavras que não sabem usar. E chegamos. Um copo e uns passos mais tarde, fala-se de amores e cabelos, gente nossa desaparecida, gente que tememos desapareça, encontra-se quem ela não conhece e ela ri-se, diz que sim, que já lá esteve num debate e que é um óptimo sítio para se trabalhar. Quer um kit-kat, que o rum vagueia sozinho no estômago. Quer saber como me pagam, diz que não é justo, que não se pode aturar tal leviandade contratual vinda de organismos públicos, mas que "...cá entre nós, não está nada mal!" E ri-se muito e conta-me mais uma carrada de coisas que eu só percebo daqui a uns dias. É tarde e vamos, dá-me um abraço e um "obrigada por me mostrares o mundo." Eu sorrio de soslaio mas sei que é verdade, que é sentido, que ela me deve uma e eu lhe devo outra.

Nenhum comentário: