sábado, 20 de março de 2010

Sitting on love


Por contraditório que pareça, passo a esmagadora maioria do meu tempo livre a trabalhar. Depois de ter atulhado a minha secretária de papelada até ao tecto, "mudei-me" sorrateiramente para a mesa da sala. Tal significa que 1) não posso dar jantares cá em casa, 2) passo todo o tempo sentada numa cadeira redonda (o que me impede de dizer que "passo tanto tempo sentada que já tenho o rabo quadrado").
Esta cadeira redonda teve a sua primeira encarnação na Noruega, na década de 1930. Alguém a salvou até ao século XXI e outro alguém a restaurou impecavelmente e pôs à venda numa loja especializada em vintage, retro, art deco... Todos esses fancy names para as outrora chamadas Antiguidades. Como o fancy é caro, eu namorei-a durante muito tempo e depois troquei-a sensatamente por uma série de electrodomésticos brancos. Mas como o verdadeiro amor nunca se esquece, mais tarde voltei a visitá-la e apresentei-lhe o meu pai. Ora, ela caiu-lhe no goto e ele resolveu apoiar a nossa relação.
Como é muito trabalhador, o meu pai não tem muito dinheiro. Contudo, tem um olho fantástico para cores e formas, absorve-as como se de uma palavra se tratasse - um conjunto de elementos (letras/sons) aleatórios e variados, perfeitamente ordenado para produzir um significado uno, um inequivocável sentido. Invejo-lhe essa capacidade, não me conformo com não a ter herdado. Apartes à parte, o meu pai tratou de arranjar todas as letras e sons necessários para reproduzir cadeira. Duas viagens a Paços de Ferreira mais tarde, a segunda encarnação das oito norueguesas habitava já a minha casa na baixa portuense.
Se isto não é o amor, então o que é?

Um ano mais tarde, sete norueguesas mudaram-se para um 5ºEsqTras. Uma ficou para trás, sob pretexto de... já não me lembro... e com a promessa de ser devolvida em breve. Hoje pode ser encontrada no mesmo lugar, riscada até ao tutano.
Se isso não é desamor, então o que é?

2 comentários:

lampâda mervelha disse...

Agora fiquei curioso. Maldita cadeira.

Wiwia disse...

É mesmo, maldita. Números ímpares são tramados de dispor no espaço.